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O chef lá de casa

  • Foto do escritor: Beto Scandiuzzi
    Beto Scandiuzzi
  • 17 de set. de 2021
  • 2 min de leitura

É muito comum escutar comentários assim:  – Ah, que saudades da comida da minha mãe; – Ah, só minha mãe sabia fazer esse frango com quiabo. Faço parte desse grupo. Coisas simples, como o jiló, o quiabo e até o chuchu eram imbatíveis quando feitos na frigideira da minha mãe. Pode até ser um engano, uma traição dos sentidos, dos sabores ou do paladar ou, o mais provável, saudade da infância.

A minha mãe adorava cozinhar e até pouco tempo antes da sua morte, quando mal podia ficar em pé, fiscalizava as panelas e dava os seus palpites sobre os temperos. Mas era o meu pai que se podia chamar um verdadeiro chef. Ele não cozinhava com regularidade, raras vezes o vi cozinhando em casa. Talvez para não melindrar minha mãe com comparações desnecessárias, já que ela era a chefa de fato, não somente da cozinha, mas da casa. Coisa que meu pai nunca se importou.

Ele deixava para colocar seus dotes em ação quando o trabalho o levava, com seus irmãos e primos, para longe de casa por toda a semana no sítio. Ele era sempre escolhido para a cozinha. Na comida não havia abundância e quase nunca sobrava. E aí que entrava em ação o melhor do meu pai: a sua criatividade. Com pouco ele fazia muito. E seu tempero era imbatível. Sua especialidade era uma tal de sopa paraguaia que a gente tomava até lamber os beiços, sem nunca ter sabido bem que ingredientes e temperos ele usava.

Contava o tio Anésio que numa ocasião, lhe pediram para preparar uma cambuquira, que como sabemos se faz com brotos de abóbora, um prato comum e barato de antigamente. O problema é que meu pai não encontrou nenhuma abóbora, o que lhe inviabilizava o prato solicitado. Mas ele não se preocupou, agarrou talos de melancia que encontrou pelo caminho, cozinhou bem, agregou boa pimenta malagueta e tempero, que era seu segredo melhor guardado. Dizia o tio que ninguém percebeu a troca, e todos comeram com o melhor dos apetites. O crime só não foi perfeito porque foi denunciado pelas folhas de melancia que ele deixou na volta da casa, testemunho para esse relato do tio.

Mas como todo chef famoso ele tinha lá suas exigências, que não eram nada em especial, o que nunca havia que faltar na cozinha era uma boa cachaça, que ele bebericava para temperar o paladar enquanto cozinhava. Contam que uma vez, a título de brincadeira, esconderam a cachaça. Quando ele percebeu, colocou a boca no trombone, falando alto, que com a fumaça que havia na cozinha não se podia cozinhar. E ameaçou fazer greve.

A fumaça era pouca e não atrapalhava, mas ele tinha que justificar a falta do seu combustível. E não continuou a cozinhar enquanto não lhe devolveram a cachaça. Direitos de um verdadeiro chef! Que ele era.

Agosto, 2021.

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