Também fui goleiro
- Beto Scandiuzzi
- 27 de jan. de 2023
- 2 min de leitura
Durante um certo período da minha infância, eu cismei que seria goleiro. Os goleiros sempre foram diferentes de todos os outros jogadores, na maneira de jogar, de vestir, de se comportar, fatos que os colocam numa classe única no mundo do futebol, ao mesmo tempo invejada e odiada, venerada e amaldiçoada. Difícil um goleiro passar despercebido numa partida de futebol.
Eu, apesar da pouca idade, já manifestava a minha porção narcisista e esta pode ter sido a razão da minha opção, fugaz e que passou sem deixar rastros nem sequelas. Corria os anos 60 e eu me inspirava no Marcial, goleiro do Corinthians daquela época, e que jogava todo de preto e joelheiras brancas, um padrão que só seria quebrado, anos mais tarde, quando Raul, goleiro do Cruzeiro de BH, entrou em campo com uma camisa amarela.
Eu nem bem chegava da escola e já corria para os fundos do prédio da máquina de beneficiar arroz, vizinho da minha casa, onde havia palha seca amontoada como um grande colchão. Eu me atirava nas bolas que meus amigos jogavam, certo de que poderia, mais tarde, defender o arco do glorioso Aramina Futebol Clube.
Nesta época, pintava nossa casa, um pedreiro de nome Agenor e que dizia ter sido goleiro nos seus tempos de juventude lá na sua longínqua cidade do nordeste brasileiro. Nas suas horas vagas ele me ensinava, com paciência, alguns segredos da posição, como defender a bola com as mãos bem abertas, evitando que ela fosse de encontro ao peito e escapasse do controle. Lições primárias de como sair do gol, enfrentar o atacante, fechar os cantos, etc… Ainda estava longe o tempo em que os goleiros teriam que ter, também, habilidade com os pés. Apesar da boa vontade do professor, dos ensinamentos, logo percebi que não teria muito futuro debaixo das traves. Anos mais tarde, eu saberia que, tampouco, teria futuro em outras posições.
Estas lembranças me apareceram agora em dezembro lendo no jornal a informação de que o goleiro Felix estaria completando 85 anos, ele que morreu em agosto de 2012. Felix era o goleiro da Seleção Brasileira de 1970. Natural de São Paulo, começou no Juventus, mas alcançou o sucesso defendendo o Fluminense do Rio, onde jogou por dez anos. Não foi uma unanimidade naquela seleção que tinha craques como Pelé, Tostão, Gerson, Rivelino. Mas, à falta de consenso em relação ao seu nome, respondeu com atuações impecáveis que ajudaram o Brasil a ganhar aquele mundial.
Mas ele não esqueceria as críticas recebidas, injustas na sua opinião. Dizia que, ele e Barboza, goleiro do mundial de 1950, eram dois grandes injustiçados do futebol brasileiro. Ele, pelo título ganho em 70, apesar dele, segundo a crítica, e Barboza pela derrota na final da Copa de 50, em pleno Maracanã. Copa que todos perderam, mas que somente Barboza foi sacrificado.
Ainda bem que eu não segui com a profissão.
Dezembro, 2022
Comments